na rua, na chuva ou na fazenda

terça-feira, abril 17, 2007

bonito demais da conta! (a declaração que eu não fiz)

me senti milton nascimento e fernando brant, os próprios, com aquela inveja saudável em "certas canções" quando se questionam "que perguntar, carece, como não fui eu que fiz?". aí então, você é quem me pergunta: porque todo esse bolodório mineiro? é pra dizer o que, afinal? respondo cá das profundidades tristes onde resolvi me exilar por algum tempo: apesar de não ser tão addicted (eita!) de ver filmes quanto uma certa pessoa que, lamentavelmente, fica se culpando por não ter conseguido amar a outra e que se sente culpada por isso e que, por acaso, é uma das pessoas que mais amei na vida - como sou um homem de meia idade dado a ilações infanto adolescentes posso vir a amar de novo e espero que tenha a mesma cara, o mesmo jeito meigo/bestafera, a mesma genialidade, o mesmo cheiro/gosto de menina-fada mas que deixe as culpas sob o tapete de onde formos - mas mesmo assim gostar de, de quando em vez, ficar com os olhos quadrados de tanto ver filmes na tv (o cinema atual me apavora pelas suas dimensões mínimas e sua multidão inacreditável, pelo fedor milhocento de pipocas e gritinhos histéricos e salpicos de cacacola na nuca) a cabo, a única coisa à qual posso me dar ao luxo de pagar.
Vez em quando, tem um que gosto. aí, danou-se! é um tal de ver e rever que sou capaz de um dia virar roteirista róliudiano tupiniquim. a bem da verdade, é forçação de barra da operadora que tem mania de reprisar à exaustão cada merda que sódeussabe! voltemos à minha explicação: já vi "quatro casamentos e um funeral" trocentasnovemilvezes - por imposição da iscái - e acabei gostando muito do personagem perpetrado por ríu grante que canalhísticamente (bom malandro coca-cola) azara todo mundo e se enrola com uma criatura bonita, mas sem sal, transa com ela, ela some; transa de novo, ela volta a sumir; mais uma transa e ela se casa com outro e ele, revoltado, vai cometer casamento com outra, mais sem sal ainda, e já no cadafalso, é salvo por um mudinho ridículo cujo papel deve ser justamente esse: o de tornar previsivelmente ridículo o final do filme. deixê-mo-los então, de fora disto aqui a partir deste ponto.
o que me impressionou não foi o romance gay entre dois escoceses - um, de saiote kilt provavelmente do clã de xã côneri (o melhor zerozerosete que eu já ví) e o outro, inglesamente trajado de terno completo e tomando chá além de... deixemos de lado! - mas sim, o que foi dito no funeral do dito cujo de saiote que morre nos festejos da tal sensabor que traça e é traçada pelo malandro cacacola.
quanta inveja me deu, fadrica, do tanto de amor exarado naqueles versos e do tamanho de vazio que o amor amado é. o amor é, por sí só, autista. se contenta consigo, se acarinha consigo mesmo e, de alguma forma se sente amado, retribuido, pleno, por ser o que é: apenas amor. amor não se lamenta, se exalta! nem que seja deste jeito aí:

"Stop all the clocks, cut off the telephone,
Prevent the dog from barking with a juicy bone.
Silence the pianos and with muffled drum
Bring out the coffin, let the mourners come.

Let aeroplanes circle moaning overhead
Scribbling on the sky the message She is Gone*,
Put crépe bows round the white necks of the public doves,
Let the traffic policemen wear black cotton gloves.

He was my North, my South, my East and West,
My working week and my Sunday rest,
My noon, my midnight, my talk, my song,
I thought that love would last forever: 'I was wrong'

The stars are not wanted now, put out every one;
Pack up the moon and dismantle the sun;
Pour away the ocean and sweep up the wood.
For nothing now can ever come to any good. "

coisa mais de bonita de se ler, de se ouvir. eu, cá do meu jeito estrambótico de ser, não me gostaria de ser amado desse jeito. me afogaria de amor e certamente, ao me afogar, esse amor morreria. não ia dar certo nunca! você tem toda razão, mas aprecie essa beleza, mesmo adulterada. relaxe e sinta-se bem por ser amada, e não, possuida!
* no original: "He is Dead"
** "Funeral Blues" autor: W.(ystan) H.(ugh) Auden (*1907 + 1973)

quinta-feira, abril 12, 2007

o milagre dos peixes

poucos dias antes da semana santa, ocasião em que o povo desanda devorar cardumes e mais cardumes de peixes e outros frutos do mar, os habitantes da baía de todos os santos engendraram um pacto macabro: morrer aos milhares como forma de protesto contra esse ictiocídio que só encontra similar nos campos de extermínio hitlerianos. assim, envolveram-se algas, camarões, robalos, tainhas, corvinas, saramonetes, carapebas, carapicus, autoridades do alto do baixo e do médio escalão do governo estadual e alguns mestres togados da prestigiosa ufba. conluio concluido, eis que começam a aparecer nas águas calmas da baía de todos os santos a partir do recôncavo milhares e milhares de escamados e encourados habitantes marinhos e essas águas, as vezes verdes, às vezes azuis, tingiram-se de branco dos mortos boiadores. passada a estupefação, vieram as primeiras conjecturas: "foram os bombeiros da ribeira!". menino! que poder devastador têm aqueles pobres rapazes que de quando em vez, detonam os próprios braços e pernas e ainda levam de troco um mergulhador babaca! que poder de fogo! atingiram saubara lá na caetanense santo amaro!
depois, uns jornalistas e radialistas uns bêbados outros equilibristas verbais começaram a desconfiar de veneno vazado da verdeamarelinha petrobras. que gente! como ousaram assacar contra uma companhia que só faz o bem sem olhar a quem, que protege o meio ambiente como a deusa da floresta ou das águas ainda que de quando em vez haja um derramamentozinho de uns lhões de litrinhos de petróleo ou diesel pelos mangues da vida afora, isso é coisa pequena! aí, outros sem ter o que fazer, arranjaram uma cúmplice para a pobre empresa. é demais. bom é que tanto a inocente petrobras quanto sua agora cúmplice brasken ficaram assim, ó! caladinhas da silva dos santos xavier! sábias!
enquanto o bate-boca continuava em todas as peixarias e butecos que pararam de vender peixe frito como tira-gosto por falta de quem os quisesse comer (houve até buteco oferecendo como cortesia!) nossas autoridades entraram em ação ou melhor, em campo. se picaram pro nascedouro da mortandade que aumentava dia a dia e fizeram o que as autoridades sabem fazer de melhor: ofereceram cestas básicas! hélas! quantas bocas famintas atiçaram mãos e braços para recebê-las (as cestas, não as autoridades ou a estas também) mas como tudo que é bom dura pouco ou tem sempre um chato pra acabar uma boa festa, uma mulher simples, lá do meio do povo, escarrou sua revolta nas telas da tv renegando tamanha obra de paternalismo: "eu sempre vivi do meu trabalho, sempre comí e me vestí com o fruto do meu suor e vêm vocês me oferecerem esmolas?!" divina indignação! ah! o que seria do lula se todo o brasil fosse assim?
bom, a semana santa chegou mas antes que chegasse a sexta (sai de baixo, judas!) as autoridades e os doutores togados chegaram à alegre conclusão: o ictiocida em massa foi uma alga de nome complicado que mata os peixes por sufocamento! aí entraram os doutores explicando todo o processo nas rádios, nos jornais e nas tevês. como quase ninguém comeu peixe (a não ser dois urubus que viraram bois de piranha), todos comeram a história. ninguém chiou a não ser um ou outro devoto de são tomé mas que não deu pra engrossar o caldo. mas eu tenho minha própria teoria: foi suicídio em massa como naquele caso de um pastor norte-americano que levou todo mundo a se matar. foi suicídio em massa num caso agudíssimo de pmdb-da-b (psicose maníaco depressiva da braba) que levou todos os peixes daquela região, no último natal, a acreditarem que papai noel existe e, quando não o viram, entraram num estado de espírito tal que só poderia acabar como acabou: boiando, mortinhos da silva. falando nisso, posso garantir a beth wagner: eu não acredito em papai noel!